Por Cecília Paine

Recentemente fui assaltada à mão armada. Ser assaltada à mão armada é uma das experiências mais assustadoras que alguém pode viver. Mas, estranhamente, o pior não foi a arma apontada pra mim — foi o que veio depois. Ou melhor, o que *não* veio: nenhum cuidado, nenhuma pergunta, nenhum gesto.

Voltei ao trabalho em estado de choque e fui ignorada. Pedi companhia para não andar mais sozinha — e fui esquecida. Gente que cruza comigo todos os dias preferiu fingir que nada aconteceu. Continuaram comendo, rindo, saindo. E eu? Que me virasse.

Isso, pra mim, é violência.

Não a do assaltante — essa é óbvia. Mas a do silêncio social. A violência passiva de quem vê a dor do outro e se abstém de fazer o bem que poderia. De quem se recusa a agir, mesmo sabendo que sua ação faria diferença.

Existe uma crença perigosa de que só é violento quem grita, bate, ameaça. Não é verdade. O descaso também fere. A omissão também destrói. E o pior: essa violência é limpa, é aceita, é invisível.

Quantas vezes você viu alguém precisar de algo básico — uma ajuda com uma sacola pesada, uma palavra amiga, uma companhia rápida — e as pessoas ao redor simplesmente ignoraram? Quantas vezes você mesmo escolheu ignorar?

A gente aprendeu que “não se meter” é sinal de equilíbrio. Que “deixar cada um com seus problemas” é maturidade. Que “não criar vínculo” é autoproteção. E assim vamos nos tornando frios, distantes, impermeáveis.

Mas isso tem nome: desumanidade.

Se você pode ajudar alguém — com um gesto, uma palavra, uma companhia — e escolhe não fazê-lo, você está sendo violento. Você está dizendo, ainda que em silêncio: “você não importa”, “eu não me importo com com você”. Você está contribuindo para que o mundo seja mais hostil.

A ausência de cuidado também mata.

E não precisa ser literal. Ela mata a confiança, o senso de pertencimento, a coragem de pedir ajuda. Mata a ideia de que estamos juntos. Mata a esperança de que alguém vai estender a mão.

E tudo isso, muitas vezes, por pura preguiça emocional. Porque “dá trabalho”. Porque “não é problema meu”. Porque “cada um com seus B.O.”.

Mas a verdade é: se o bem está ao seu alcance e você escolhe não fazê-lo, você faz parte do problema. Você é agente da violência que tanto diz condenar. Se a gente acha normal abandonar alguém que acabou de ser assaltado, então talvez o que esteja em crise não seja a segurança pública — 
É a nossa humanidade.

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